Topo

Rodrigo Hübner Mendes

Não é à toa que me apaixonei pelo Barcelona

ECOA

13/03/2020 08h39

Josep Maldonado é uma figura extraordinária que tive a sorte de conhecer durante uma conferência promovida pela Fundação do time do Barcelona. Além da expressiva carreira política (senador pela sua terra natal, Catalunha, por 2 mandatos), Maldonado tem especial atração pela África, continente que conhece como poucos. De seus 54 países, visitou 52, só faltando Líbia e República Centro-Africana. 

Durante uma viagem à República do Máli, Josep foi conhecer a cidade de Tombuktu, localizada em região desértica no nordeste do país. Era uma cidade (na verdade uma vila grande) simples, extremamente atraente em virtude de suas construções em barro. "De onde você vem?", perguntou-lhe em francês um garoto que o abordou sorrindo enquanto passeava pela cidade. Maldonado contou que vinha da Espanha, de Barcelona. O rosto do menino se iluminou e ele recitou de cor a escalação inteira do Barça, do goleiro ao ponta-esquerda.

Josep ficou encantado com o entusiasmo do garoto e perguntou se poderia conhecer sua casa. Imaginava que se tratava de uma habitação de classe média, com ao menos uma TV onde assistiam a jogos de futebol. Ficou surpreso ao perceber que era uma casa muito humilde, sem luz e sem água. A família e os animais de estimação dormiam todos num só cômodo. Como podia aquele menino ali saber tudo sobre o Barcelona, se nem rádio havia na casa? 

Finda a visita, Maldonado foi até o escritório de uma companhia aérea local, em Bamako, e perguntou se uma remessa enviada da Europa a um local pobre daquela vila teria chances de chegar. O atendente garantiu que sim e lhe deu as orientações sobre como proceder. De volta a Espanha, logo que pôde foi a uma loja oficial do FC Barcelona e comprou uma camiseta que lhe pareceu servir no garoto. Embalou e remeteu conforme as instruções obtidas em Tomboktu, torcendo para que o procedimento desse certo, num lugar que sequer tinha nome e número de rua.

Passado mais ou menos um ano, duas amigas de Maldonado lhe pediram sugestões sobre uma viagem que fariam à África. Elas iriam a dois países, um deles o Máli. Conhecendo bem a região, ele deu todas as dicas e recomendou que conhecessem Tombuktu e suas casas de terra. As amigas seguiram todas as recomendações e, durante um passeio, cruzaram com um garoto simpático, que lhes perguntou de onde vinham. Ao ouvir "Barcelona", o menino arregalou os olhos e pediu que esperassem ali mesmo, paradas, que ele voltaria logo com uma coisa que lhes interessaria. As duas se olharam e aceitaram. Coisa de dez minutos depois, o garoto chegou correndo, vestindo uma camisa do Barcelona. "Josep, Josep", repetia. A conexão tinha dado certo! Mais que isso, o autor do presente ficou sabendo do improvável fato. 

Minha admiração pelo Barcelona começou a ganhar maiores proporções em 2013, quando iniciamos uma parceria no campo da educação inclusiva, juntamente com o Unicef, que vem impactando educadores e estudantes de todos os estados do Brasil. Tive a chance de conhecer de perto os incríveis programas sociais financiados por eles em várias partes do mundo. Mais do que isso, passei a observar com atenção a profunda relação da marca do time com sentimentos de alegria e simpatia. O futebol bem jogado, que prioriza a beleza do toque de bola e o drible, acaba sendo quase que um reflexo natural dessa marca. Maldonado, ex-dirigente do time, é um ótimo símbolo dessa força que se espalha pelos mais remotos vilarejos do planeta. Uma honra ter me tornado seu amigo, Josep.

Sobre o Autor

Rodrigo Hübner Mendes tem dedicado sua vida para garantir que toda pessoa com deficiência tenha acesso à educação de qualidade na escola comum. É mestre em administração pela Fundação Getúlio Vargas (EAESP), membro do Young Global Leaders (Fórum Econômico Mundial) e Empreendedor Social Ashoka. Atualmente, dirige o Instituto Rodrigo Mendes, organização sem fins lucrativos que desenvolve programas de pesquisa e formação continuada sobre educação inclusiva em diversos países.

Sobre o Blog

A garantia do direito à educação para todos é o ponto de partida para reflexões sobre equidade, diversidade humana e construção de uma sociedade inclusiva.